Todo dia repete o que? O dia?
A lotação e a estrada lotada de caminhão. Asfalto quente, fumaça, uma solidão.
A rua é via, é correria. Informações de vidas que caladas deixam nos vidros engordurados de cabelos amanhecidos restos de olhares. Olhos sem brilho boiam nas faces apáticas, sombreados por olheiras cansadas, causadas de tanto olhá pra tamanha quantidade de gente a andá, a pará, a entrá, saí e levantá.
Duas putas sentam após o fim de expediente, já é manhã.
Uma cega declama seu discurso ensaiado,já é tarde, não percebe que o ônibus está vazio. Senta-se ao meu lado e me expreme com seu não-ver que faz com que os sons dos aviões, motos e outros diversos motores gritem aos meus ouvidos.
O garoto sai da cadeia após dois anos de prisão. Nunca havia visto o modelo novo do carro que passa. Irá tomar café-da-manhã na casa da mãe. Ela não sabe. Ele está feliz.Já é manhã de novo
Wisnik sai da caixa de Mp3 através de um cordão. "Anoitecer":
"É a hora em que o sino toca,
mas aqui não há sinos;
há somente buzinas,
sirenes roucas, apitos
aflitos, pungentes, trágicos,
uivando escuro segredo;
desta hora tenho medo.
É a hora em que o pássaro volta,
mas de há muito não há pássaros;
só multidões compactas
escorrendo exaustas
como espesso óleo
que impregna o lajedo;
desta hora tenho medo.
É a hora do descanso,
mas o descanso vem tarde,
o corpo não pede sono,
depois de tanto rodar;
pede paz - morte - mergulho
no poço mais ermo e quedo;
desta hora tenho medo.
Hora de delicadeza,
gasalho, sombra, silêncio.
Haverá disso no mundo?
É antes a hora dos corvos,
bicando em mim, meu passado,
meu futuro, meu degredo;
desta hora, sim, tenho medo."
quarta-feira, 19 de agosto de 2009
sábado, 8 de agosto de 2009
É inverno, e daí?
(foto da katia...linda!http://www.orkut.com.br/Main#AlbumZoom.aspx?uid=7429907756300229000&pid=1249565284983&aid=1249539790$pid=1249565284983)
E aí, soltas no ar, as várias versões de mim se confundem com a paisagem. Cidade loucamente com sua velocidade desprópria, imprória. Mas imprópria a quê?
O basal de mundo que incessantemente e insensatamente tentamos prevêr se dissolve em meio de partículas são cinzas e azul petróleo.
Desapropia o que há seculos inventou esse conceito nada natural de propiedade. Somos a invasão do que não tem dono por natureza. As forças que compõe o contorno apoiético que se faz meus eus é risonho como mar que se destoa em formas: velocidades, espuma e força.
SIm! Por todas as partes gritam os "sins". Sim pelo que há por vir: incerto, nublado, mas tocante.
Afeto que desvai...
Vivo comigo nesta aventura de se viver...
benvindo...sempre vindo ...se movimentando pelos toques e não pelas previsões....
É pau, é pedra, é o fim do caminho
É um resto de toco, é um pouco sozinho
É um caco de vidro, é a vida, é o sol
É a noite, é a morte, é o laço, é o anzol
É peroba do campo, é o nó da madeira
Caingá, candeia, é o MatitaPereira
É madeira de vento, tombo da ribanceira
É o mistério profundo, é o queira ou não queira
É o vento ventando, é o fim da ladeira
É a viga, é o vão, festa da cumeeira
É a chuva chovendo, é conversa ribeira
É inverno, e daí?
É o pé, é o chão, é a marcha estradeira
Passarinho na mão, pedra de atiradeira
É uma ave no céu, é uma ave no chão
É um regato, é uma fonte, é um pedaço de pão
É o fundo do poço, é o fim do caminho
No rosto o desgosto, é um pouco sozinho
É um estrepe, é um prego, é uma ponta, é um ponto
É um pingo pingando, é uma conta, é um conto
É um peixe, é um gesto, é uma prata brilhando
É a luz da manhã, é o tijolo chegando
É a lenha, é o dia, é o fim da picada
É a garrafa de cana, o estilhaço na estrada
É o projeto da casa, é o corpo na cama
É o carro enguiçado, é a lama, é a lama
É um passo, é uma ponte, é um sapo, é uma rã
É um resto de mato, na luz da manhã
É inverno, e daí?
É a promessa de vida no teu coração
É uma cobra, é um pau, é João, é José
É um espinho na mão, é um corte no pé
É inverno, e daí?
É a promessa de vida no teu coração
É pau, é pedra, é o fim do caminho
É um resto de toco, é um pouco sozinho
É um passo, é uma ponte, é um sapo, é uma rã
É um belo horizonte, é uma febre terçã
É inverno...e daí?
É a promessa de vida no teu coração
pau, pedra, fim, caminho
resto, toco, pouco, sozinho
caco, vidro, vida, sol, noite, morte, laço, anzol
São as águas de março fechando o verão
É a promessa de vida no teu coração.
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