Amargo. Assim sinto o mundo. Imundo de restos de cascas, peles, unhas e pêlos. Percebo, mesmo no invisível, todas as sobras destes instantes que passaram. O mundo também é feio. É feito de escarro, do irônico que se espalha por toda a sala, de sentar desconfortável em sofá cheio de espumas velhas que causam alergia.
O mundo também fere. É ferida. É pus de rua. É grito de sofrer e sofrimento de calar-se. É se debater. É se prolongar derretendo-se. É não se querer e pensar em pular. Se admirar imaginando o voar. Quando o sufoco parece não mais só sufocar, mas também deseja empurrar, deseja matar.
Mas o que matar? Matar a mim, o mundo, o agora? A proximidade entre morrer e se sentir morrendo se faz tão presente que não sei mais se há diferença. Fúnebre pensar.
Ele então aluga um quarto no décimo andar daquele hotel no centro da cidade turbulenta. Privado em si olha de cima todo o público recheado de sons de buzina e se entrega a eles. Se joga, e durante alguns segundos sente-se bem. Antecede a morte sensação de viver. Neste instante não mais se morre. Aproveita o ar rasgando sua face e não passa filme de sua vida. Ele apenas olha como a calçada se aproxima com velocidade esclarecedora. Era uma risca, era uma árvore, era uma cesta de lixo. Repara nas cores, nos traços desenhados na rua, nas linhas que se cruzam, nas luzes que se movimentam com o seu cair. O que menos queria neste momento era pensar no que passou. O que quer é sentir de novo a possibilidade de olhar o agora de um jeito menos sufocante. Quer o agora com vento e não mais com água podre parada de esgoto.
O mundo também é feio. O que vem mesmo depois da morte?
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